Editorial Estadão
Quando decidiu oferecer solidariedade a Luiz Inácio Lula da Silva, visitando o chefão petista com estardalhaço um dia depois que ele se viu como alvo central da Operação Lava Jato, a presidente Dilma Rousseff amesquinhou vergonhosamente a Presidência da República, reduzindo-a a um mero puxadinho de um dos tantos imóveis de que o ex-presidente usufrui graças a favores de amigos do peito.
Fazendo uso pessoal e político-partidário do aparato presidencial, como o avião e o helicóptero oficiais, Dilma foi a São Bernardo para prestar vassalagem pública a Lula, num ato de sabujice que, além de ilegal, desonra o cargo que ela ocupa. De quebra, a presidente se prestou a engrossar o coro dos que enxergam na Justiça o centro de um “golpe” contra seu governo e contra Lula, configurando inaceitável desrespeito do Executivo pelo Judiciário.
Esse comportamento grotesco serve somente para confirmar aquilo que os brasileiros já sabem: Dilma não existe mais como presidente. Sua insistência em permanecer nesse cargo, para o qual nunca teve aptidão e já não tem legitimidade, apenas piora uma situação já de si muito grave. Para que não se atinja o temido ponto de ruptura, em que a violência toma o lugar do debate político, Dilma deveria ter a decência de renunciar, abrindo caminho para a necessária normalização das relações institucionais e para a retomada da confiança na capacidade do governo de governar.
No entanto, em diversas oportunidades, Dilma já avisou que jamais tomará a iniciativa de abreviar seu mandato. Ela costuma vincular essa disposição a seu passado de guerrilheira que suportou a tortura nos porões da ditadura – como se o impeachment, que está previsto na Constituição, ou os movimentos que democraticamente defendem sua renúncia fossem comparáveis aos absurdos do regime militar.
Mas foi a um absurdo que Dilma e os petistas reduziram o debate político atual. Para salvar o ex-presidente Lula da cadeia e Dilma do impeachment, o PT tenta transformar o País numa rinha de galos, isto é, pretende arrastar os indignados brasileiros de bem para o mesmo nível de truculência ao qual a tigrada está habituada. A confusão moral é o que aduba a erva daninha petista.
Enquanto isso, o País segue sem rumo, em profunda crise, graças a uma presidente que não governa mais – isso depois de ter condenado a economia a uma retração que só se costuma observar em tempos de guerra ou de grandes catástrofes. Restou a Dilma caçar “mosquitas”, entregar casas do Minha Casa, Minha Vida e defender Lula.
Ao usar o avião e o helicóptero presidenciais para fazer uma visita particular a seu padrinho e ao aparecer em público em clima de comício, com o braço erguido, ao lado de Lula, suspeito de chefiar uma grande quadrilha de corruptos que assaltaram o País, Dilma fez sua opção: decidiu ficar contra a maioria absoluta dos brasileiros, incompatibilizando-se de vez para o exercício da Presidência.
Do ponto de vista político, é sua última cartada. Mesmo depois que Lula e seus apaniguados se posicionaram publicamente contra o governo de Dilma, considerado por muitos petistas como “neoliberal”, a presidente concluiu que ela não é nada sem seu chefe. Conforme esse cálculo, sua sobrevivência no cargo depende do apoio de Lula e do partido que lhe virou as costas, mesmo que isso signifique total subserviência ao PT – cujos líderes, se não estão presos, enfrentam hostilidade em locais públicos – e, principalmente, a seu líder, em cujos calcanhares está a Justiça. Não é uma boa perspectiva.
Do ponto de vista legal e moral, o caminho trilhado por Dilma não tem volta. A presidente faz prevalecer seu interesse pessoal em detrimento do interesse público. Deixou de ser a governante de todos os brasileiros para servir a Lula. Misturou-se à tigrada que hoje pretende intimidar aqueles que estão empenhados no cumprimento da lei.
Assim, cresce a percepção, inclusive no Congresso, de que Dilma está no cargo apenas para salvar Lula, e nada mais. O País e suas instituições não podem se curvar a isso.
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