Politicagem explícita

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Por Merval Pereira

Os quase 14 milhões de desempregados que o país tem hoje, segundo o IBGE, não nasceram de ontem para hoje, são fruto de um governo desastroso que colocou o país na maior recessão já registrada. Três anos seguidos de PIB negativo não se resolvem sem muito sacrifício.

O chamamento esperto para uma greve geral às vésperas de um feriadão, contra as reformas trabalhista e previdenciária, querendo transformar em salvadores da pátria os mesmos que nos colocaram nesta situação, embute não apenas esperteza mas também o estilo de fazer politicagem que levou à situação atual.

O ex-presidente Lula no início de seu primeiro governo, anunciou seu apoio à revisão da CLT, que chamava do “AI-5 dos trabalhadores”, dentro de uma reforma trabalhista que tinha por base a flexibilização da legislação. E se propôs a continuar a reforma da Previdência, que deixou inacabada quando preferiu manter sua base sindical em vez de manter-se na decisão reformista.

O governo foi muito criticado por querer fazer uma reforma trabalhista, a exemplo do que foi tentado no final do governo Fernando Henrique e barrado pelo PT no Congresso, na qual o negociado prevalecesse sobre o legislado, como afinal foi aprovado agora na reforma trabalhista que passou na Câmara.

O próprio Lula já havia declarado não ser possível continuarmos com uma lei da década de 40, lembrando que quando começou no sindicalismo, em 1972, já lutava contra a CLT. O Lula líder sindicalista defendia o fim da Era Vargas, de quem dizia que, se foi o “pai dos pobres”, era também “a mãe dos ricos”.

No manifesto de lançamento do Partido dos Trabalhadores, de 1980, está escrito: “O PT nasce da vontade de independência política dos trabalhadores, já cansados de servir de massa de manobra para políticos e os partidos comprometidos com a manutenção da atual ordem econômica, social e política”. O discurso de Lula na primeira convenção nacional do Partido dos Trabalhadores, em setembro de 1981, diz com orgulho que o PT nasceu dos operários de macacão e o define como uma “inovação histórica”.

A lei sancionada pelo presidente Lula em 2008 reconhecendo as centrais sindicais, no entanto, nos fez retornar aos tempos do Estado Novo getulista, ressuscitando o papel do Estado como indutor da organização sindical.

A “legalização” das centrais sindicais ficou conhecida como “pelegalização”.  Hoje, a CLT e a unicidade sindical (apenas um sindicato por categoria em cada município), marcos da Era Vargas, persistem, e o sindicato continua atrelado ao Estado, baseado financeiramente na obrigatoriedade da contribuição sindical de um dia de salário de todos os trabalhadores brasileiros, mesmo os não sindicalizados.

Essa contribuição passou a ser opcional com a reforma trabalhista aprovada na Câmara, e os sindicatos saíram às ruas para defender seus privilégios. O mercado de trabalho hoje, muito influenciado pela globalização, já não comporta a visão getulista de um país isolado. As mudanças na CLT são necessárias devido ao sistema econômico, onde custo do trabalho formal, com proteção social, é muito elevado e provoca a fuga para a informalidade: seis em cada dez trabalhadores são informais.

Foi por isso que, em maio de 2015, a então presidente Dilma aproveitou o Dia do Trabalhador para fazer, pela televisão, uma defesa da terceirização, hoje tão abominada por ela mesma e pelos partidos de esquerda. A presidente usou os mesmos argumentos que o atual governo para defender sua regulamentação: a necessidade de dar segurança jurídica a empregados e empregadores. Citou cerca de 13 milhões de empregados que teriam sua situação regularizada. Hoje, ela diz que a lei de terceirização é o fim da CLT.

Em 2016, em uma entrevista coletiva, a então presidente Dilma disse que era hora de voltar a discutir reformas como a da Previdência. “Nós vamos encarar a reforma da Previdência, sempre considerando que ela tem a ver com uma modificação na idade e no comportamento etário da população brasileira. Nós estamos envelhecendo mais e morrendo menos. Não é possível que a idade média de aposentadoria no Brasil seja 55 anos. Para as mulheres um pouco menos”, declarou.

Os dois tinham razão. A imensa massa de milhões de desempregados em consequência da crise econômica que assola o país não foi protegida pela CLT. E a reforma da Previdência é fundamental para equilibrar as contas públicas. (publicado em OGLOBO)

 

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