Pesquisa exclusiva encomendada pelo GLOBO revela ainda que, para 38% dos entrevistados, o povo é o maior responsável pela situação e, para outros 33%, é o presidente Jair Bolsonaro
Rafael Garcia
06/09/2020 – 04:30
SÃO PAULO — A cisão ideológica nacional se reflete nas diferentes percepções sobre o impacto da pandemia no Brasil. Pesquisa exclusiva do Ibope encomendada pelo GLOBO revela que 71% dos usuários de internet do país concordam que o baque da Covid-19 foi maior do que o esperado. Quando se busca um culpado, porém, as opiniões se dividem. Para 38% dos entrevistados, o povo é o maior responsável pela situação; para outros 33%, é o presidente Jair Bolsonaro.
Ao separar os entrevistados por preferência política, a pesquisa mostra o acirramento político com nitidez. Entre os que se declaram de direita, apenas 8% veem Bolsonaro (sem partido) como principal agente do agravamento da epidemia, enquanto 45% põem maior carga de culpa na população. Já no universo de esquerda, 78% responsabilizam o presidente, enquanto 15% apontam para o povo brasileiro.
A gente já está vivendo há algum tempo essa polarização, essa radicalização de ideias, e a pandemia entrou nessa toada — afirma Márcia Cavallari Nunes, CEO do Ibope Inteligência. — Temos observado debates em vários campos, com divergências sobre fazer distanciamento social ou não, usar certa medicação contra Covid-19 ou não, tomar a vacina ou não.
Uma leitura direta dos resultados da pesquisa sugere que a estratégia de rachar a opinião pública e cavar trincheiras para conquistar território está funcionando. Jair Bolsonaro, que voltou-se contra medidas de distanciamento social e insistiu na promoção de medicamentos sem eficácia comprovada, como a cloroquina, parece contar aqui com a base de apoio de cerca de 30% que exibe em outras enquetes.
Sua taxa de culpabilidade verificada na nova pesquisa é de fato relevante, mas ainda longe de ser majoritária — e menor que a culpa que os entrevistados atribuíram à própria população.
Entre os que se descreveram como sendo de direita, houve uma expectativa menor de que a ciência saia mais valorizada da pandemia, o que pode ser um reflexo do acirramento entre o presidente e a comunidade acadêmica.
Márcia Cavallari aponta que todos os campos da vida nacional — mesmo a percepção da ciência — estão mais polarizados, ainda que a diferença de opinião (de 9% entre esquerda e direita) seja bem menos elástica do que a percepção sobre quem é o maior responsável pelo tamanho da tragédia do novo coronavírus no Brasil.
No universo investigado pela pesquisa, o grupo que se autodenominou como de centro foi o maior de todos, com 28%. A direita representou 24%, e 16% se identificam com a esquerda.
Uma parcela não pôde ser enquadrada no cenário ideológico de eixo único, pois 8% disseram não saber onde se encaixariam no espectro político, e 7% disseram não saber o que é ser de direita ou de esquerda. Outros 17% preferiram não responder.
Percepção pela renda
Uma disparidade na percepção de impacto da pandemia também transparece no recorte por renda familiar.
Enquanto 48%com renda até um salário mínimo e 52% com renda de um a dois salários mínimos concordaram totalmente que a Covid-19 teve impacto pior que o esperado, nas faixas de renda de 2 a 5 ou acima de 5 salários mínimos essas porcentagens foram de 46% e 43%, respectivamente.
A diferença pode ser explicada pela maior dificuldade dos mais pobres em manter o sustento no período.
— Muitos nutriam (no início) a expectativa de que a pandemia iria acabar mais cedo, de que a vida iria voltar ao normal, de que não perderiam o emprego, mas eles perderam — diz a CEO.
Fonte :O GLOBO
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