“Confesso que não venho até aqui falar-vos sobre o problema da educação sem certo constrangimento: quem recorrer à legislação do País a respeito da educação, tudo aí encontrará. Sobre assunto algum se falou tanto no Brasil e, em nenhum outro, tão pouco se realizou. Não há, assim, como fugir à impressão penosa de que nos estamos a repetir. Há cem anos os educadores se repetem entre nós. Esvaem-se em palavras, esvaímo-nos em palavras e nada fazemos. Atacou-nos, por isto mesmo, um estranho pudor pela palavra e um desespero mudo pela ação.”
Esse discurso foi proferido pelo educador Anísio Teixeira na Assembléia Legislativa da Bahia em 1947. Hoje, passados 61 anos, infelizmente, as palavras de Teixeira continuam atuais.
Alunos em salas lotadas. Desvios de verbas para educação. Greves de professores. Novas metas do governo para educação. Salas de latas. Violência nas escolas. Resultados decepcionantes no Enem. Resultados piores no Enade. Falta de mão-de-obra capacitada. Assuntos como estes ganham cada vez mais destaque nos veículos de comunicação.
Não faltam fatos e estatísticas para mostrar à sociedade uma realidade inalienável: os vários projetos de desenvolvimento do Brasil não contemplaram a educação, pelo menos, não de maneira satisfatória. Pouco foi feito. E como produto de vários equívocos, pode-se comemorar apenas a quase universalidade do ensino, sob o marco de 97% das crianças em idade escolar matriculadas no ensino fundamental.
Mas as estatísticas enganam. Só os 3% restantes somam um contingente de 1,03 milhão de brasileiros. E não é só isso. Dados de 2006 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram que 14 milhões de brasileiros com até 17 anos ainda estão fora da escola ou creche em todo o País. Esse número é mais que o dobro da população da Finlândia, que tem 5,2 milhões de habitantes e cuja educação é exemplo para vários países.
O Brasil universalizou o acesso, mas não o ensino. Aliás, forma-se anualmente uma legião de analfabetos funcionais, não na concepção acadêmica – que engloba somente o indivíduo maior de 15 anos com escolaridade inferior a quatro anos -, mas sim pessoas que tendo aprendido são incapazes de decodificar minimamente a escrita, mesmo frases curtas, não desenvolveram a habilidade de interpretação de textos, nem de matemática, ficando incapacitados de desenvolver-se pessoal e profissionalmente.
Segundo dados do Instituto Paulo Montenegro, no ano passado, o analfabetismo funcional atingiu cerca de 32% da população de 15 a 64 anos – destes, 7% são analfabetos e 25% têm um alfabetismo rudimentar, isto é, conseguem localizar apenas informações explícitas em textos curtos.
Equações como estas não se enquadram aos projetos de aceleração do crescimento do País dos governos contemporâneos. Assim como a elevada taxa de analfabetismo do início do século XX, em torno de 60% da população, também não favorecia os planos de transformar a economia agrícola em indústria. Anísio Teixeira sabia dessa realidade. E como ele diversas pessoas no século passado pensaram sobre a educação no Brasil. O que deu errado?
Fonte: Gazeta Mercantil
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