A Legislação Eleitoral é muito benevolente

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Entrevista de Sidney Madruga, procurador regional eleitoral – Jornal ATARDE, edição de 03/05/2010.

Por: Aguirre Peixoto 

Oficialmente, a campanha eleitoral começa em 5 de julho. Porém, na prática, os pré-candidatos começaram a se mostrar muito antes disso.

Desde dezembro do ano passado, a Procuradoria Regional Eleitoral da Bahia tem ajuizado ações contra os políticos baianos por propaganda antecipada.

Os três principais pré-candidatos, Jaques Wagner (PT), Geddel Vieira Lima (PMDB) e Paulo Souto (DEM) já foram enquadrados pela PRE por propaganda irregular.

O procurador regional eleitoral, Sidney Madruga, à frente da PRE este ano, é enfático: “Há realmente uma propaganda escancarada”.

Nesta entrevista, ele critica o pouco rigor da legislação eleitoral e admite que o caixa dois (doações de campanha não-declaradas à Justiça) ainda é o grande problema: “É difícil controlar”.

Madruga diz que o cidadão tem papel importante na denúncia de irregularidades, a exemplo da propaganda eleitoral antecipada ou irregular durante a campanha e pede o encaminhamento de denúncias:

A campanha ainda não começou oficialmente, mas já foram flagrados vários casos de propaganda eleitoral antecipada. Nós da Procuradoria Regional Eleitoral baiana somos, até agora, a primeira do Brasil em número de ações contra pré-candidatos de propaganda antecipada.

Que balanço o senhor faz deste trabalho?

Estamos chegando quase a 50 ações, enquanto que no Rio de Janeiro e São Paulo beiram as dez ações.O compromisso nosso é que,uma vez obtido algum tipo de material que indique propaganda antecipada, no máximo em 72 horas esse material é analisado e ajuizamos as ações. Pode-se dizer que Salvador está mais limpa do que há alguns meses.

A propaganda começou com muita força em dezembro e começamos logo a coibi-la.

O que havia naquela época? Muitos outdoors e busdoors.

Intensificamos agora o trabalho no interior, pedimos a colaboração dos promotores eleitorais do interior porque não temos recebido material de lá, e já ouvimos falar do excesso de propaganda antecipada fora da capital. Isso é proibido por lei, a propaganda eleitoral só pode começar a partir de 5dejulho.

Não pode aparecer mensagem do político, mesmo que não esteja pedindo voto? Sim, isso já está decidido pelos tribunais eleitorais.A propaganda vem disfarçada, dissimulada.Ele não pede voto diretamente, mas fala,por exemplo:‘Estou ao lado dos pobres e oprimidos’;‘ Em defesa das mulheres, dos idosos, das crianças’; ‘Agora é hora’. Mas o que estão querendo é mostrar-se para o eleitor, até porque essas mensagens não são só os textos, são as fotografias, que aparecem bem maiores. O que está por trás é dizer assim: ‘Estou aqui para vocês votarem mim’. Isso tem desaguado em muitas ações no Tribunal Regional Eleitoral que, felizmente, tem feito sua parte. As multas têm sido aplicadas, a Justiça Eleitoral tem sido equilibrada em suas decisões e as liminares estão saindo muito rápido. As liminares têm o efeito de retirar a propaganda e depois a ação é julgada e pode resultar em uma multa.

As campanhas eleitorais estão começando cada vez mais cedo? Este ano há uma disputa mais acirrada, principalmente aqui ao governo estadual.

Isso tem levado a esses excessos. No início da nossa luta, fomos até acusados de perseguir determinados candidatos, mas isso se desfez porque hoje temos ações ajuizadas contra os três principais pré-candidatos ao governo da Bahia (Jaques Wagner, do PT, Geddel Vieira Lima, do PMDB, e Paulo Souto, do DEM) e praticamente todas as legendas, por causa de propaganda feita pelos deputados.
Somos apartidários nesse aspecto

São muitas as pressões sofridas nesse período? Não há pressão. Nunca houve de Brasília, por parte da Procuradoria Geral Eleitoral, nenhum tipo de telefonema para nos exigir qualquer ação, mas claro que há queixas dos partidos e dos pré-candidatos, isso é compreensível da democracia.

Aceitamos com naturalidade as críticas, ninguém quer ser processado.

Temos critérios, muitas vezes recebemos representações sem fundamento e arquivamos. Mas há realmente uma propaganda escancarada.

E em relação à campanha nacional, apesar de não ser objeto de ação da Procuradoria Regional Eleitoral, os pré-candidatos também estão exagerando?

O que a gente tem visto é realmente um desaforo.

Entendo que deveria haver um combate maior, mas eu não posso entrar nessa área porque não diz respeito a nossa atuação. A população tem visto de forma despudorada a propaganda, os pré-candidatos saem por todo o Brasil efetivamente fazendo campanha, isso já se tornou comum. Houve algumas multas, infelizmente sofreram até zombaria, mas precisaria haver mais combate.

Qual a posição da Procuradoria em relação aos‘ fichas-sujas’ (candidatos que concorrem às eleições mesmo respondendo a processos na Justiça)? O senhor acha que eles não deveriam poder se candidatar? Sem dúvida. Sou completamente a favor da divulgação da lista dos ‘fichas-suja’, que foi feita inicialmente pela Associação dos Magistrados do Brasil de uma forma exemplar, mas que não foi aceita pelo Tribunal Superior Eleitoral nem pelo Supremo Tribunal Federal, que entenderam que seria um pré-julgamento.

Eu humildemente discordo, mas temos que acatar e permitir que eles concorram.

Há um projeto de lei no Congresso Nacional, sou favorável, acho que a população tem que ser esclarecida a respeito de quem realmente tem uma conduta correta daquela pessoa que não, que tem um histórico de crimes. Não digo todos, às vezes um delito de trânsito não pode impedir que se candidate, mas um sujeito é condenado por lesão corporal, morte, seqüestro, ainda que em primeiro grau, e qual a legitimidade que ele tem para concorrer a um cargo eletivo. Como ele sempre pode recorrer na Justiça a uma instância superior, demora muito para ter uma sentença transitada em julgado, sem direito mais a recurso.

Exatamente, vai levar 10, 15, 20 anos, e a eleição já passou há muito tempo.

Deveria haver algum mecanismo que proibisse, pelo menos já se fala em condenação em primeiro grau, seria um avanço.

A Procuradoria vai fazer divulgação de candidatos baianos com‘ ficha-suja‘? Não compete muito à Procuradoria fazer isso, até porque já existem outros órgãos que divulgam. Hoje aquele indivíduo que tiver a possibilidade de fazer uma pesquisa na internet, vai encontrar quem são os ’fichas-sujas’, mas a Procuradoria não tem realmente essa atribuição, até porque poderiam dizer que estaríamos sendo parciais com algum candidato, isso a gente não quer.

Essa nova legislação eleitoral, aprovada no final do ano passado pelo Congresso Nacional, melhorou a regulamentação da área? A lei é muito benevolente e complacente. Por exemplo, a multa de R$ 5 mil a R$ 25 mil é muito pequena para aqueles candidatos que têm por trás de si milhões de reais. Às vezes vale a pena pagar uma multa dessas e continuar infringindo a lei.

Por isso é importante à divulgação pela mídia das punições, isso inibe o candidato e educa o eleitor.

Enquanto a lei proíbe outdoor, ela permite que o sujeito se manifeste em rádio, televisão e internet. Ele pode divulgar seus programas partidários abertamente, desde que não peça voto. Isso necessariamente leva a um excesso, que deságua na propaganda antecipada.

A lei foi muito dúbia.

Qual a expectativa em relação à internet, que foi regulamentada pela primeira vez nesta lei? Muito pouco regulamentada.

É praticamente impossível este controle. Nós realmente não temos pessoal para isso, nem podemos ficar o dia todo debruçados na internet porque temos muitos outros afazeres, mas na medida em que as pessoas forem tomando conta dessas irregularidades e nos encaminharem, as situações serão avaliadas.

Mas é muito difícil.

As regras deveriam ser mais rígidas? Não vejo problema em serem utilizadas as redes sociais, mas temos que coibir os excessos. Usar twitter, facebook, orkut, para denegrir, macular outro candidato, deveria ser fortemente punido. Montagens de vídeos, truncagem de áudios.

Mas não tem previsão na lei. Talvez crime contra a honra, mas deveria ter previsão de tirar o site do ar ou aplicar uma multa. Tenho para mim que vai haver um grande descontrole em relação à internet por causa da falta de regulação.

E as doações ainda são o grande problema das eleições brasileiras? É, o caixa dois é o grande problema, é difícil controlar.

Já existe alguma coisa sendo estudada pelo TSE para que haja um maior controle do caixa dois, mas ainda assim a legislação não é muito forte, tem muitos vácuos.

Ocorre em todo o País e também aqui na Bahia? Sim, aqui na Bahia também há, mas nós com certeza iremos coibir. Os partidos são obrigados a prestar contas e dentro dessa prestação, nós identificamos doações acima do limite, isso é rastreado.

Com a possibilidade de doações pela internet, disciplinada pela nova legislação, dificulta mais o controle? Nesse tipo de doação só se pede o preenchimento de um formulário eletrônico, sem a assinatura do doador.

A tecnologia já prevê a possibilidade de assinaturas eletrônicas, mas isso não foi exigido na legislação.

Eu entendo que apenas com um formulário vai dificultar a localização das pessoas, deixa a desejar. Pode ser fraudado.

 

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