Liberdade de imprensa, compromisso de campanha

, , Leave a comment

Por: Carlos Alberto Di Franco – Diretor do Master em Jornalismo, professor de Ética e doutor em Comunicação pela Universidade de Navarra

A candidata Dilma Rousseff assumiu publicamente compromisso com a liberdade de imprensa e de expressão. Chegou a dizer, numa afirmação que contrasta com os precedentes de seu partido, que “o único controle que admite é o controle remoto”.

Em seu primeiro discurso como nova presidente do Brasil, Dilma renovou seu compromisso: “Prefiro o barulho da imprensa livre ao silêncio das ditaduras.” Bom começo.

Agora, os conceitos devem ser traduzidos em ações. E Dilma já tem pela frente um primeiro teste. Lula decidiu tocar adiante o polêmico projeto que cria o marco regulatório da comunicação eletrônica. Mas não o enviará ao Congresso. A decisão está nas mãos de Dilma Rousseff.

Há grande desconfiança entre os profissionais de comunicação quanto aos reais propósitos do projeto. E não é suspeita gratuita.

Afinal, em oito anos uma das constantes do governo Lula foi a tentativa de controlar os meios de comunicação. Desde do frustrado lançamento do Conselho Nacional de Jornalismo até a realização da Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) em 2009, por convocação do governo Lula, o denominador comum é impressionante: tentar impor censura aos meios de comunicação e, em especial, à imprensa. Tenta-se, reiteradamente, montar um cenário aparentemente afirmativo: a defesa da “democratização” dos meios de comunicação. A palavra de ordem é romper a ação da “mídia monopolista”. Mas o objetivo final é sempre o mesmo: controlar, punir, fiscalizar, censurar.

Apresenta-se o governo como defensor da sociedade contra abusos e excessos cometidos por jornais, revistas, rádios e televisões.

Ergue-se, igualmente, contra os formadores de opinião que se atrevem a contestar o discurso único. “Nós somos a opinião pública”, declarou o presidente da República em notável arrebatamento.

O argumento não se sustenta. Para coibir abusos há a Justiça, como em qualquer sociedade democrática. Para garantir a democratização e multiplicidade há a concorrência.

O que o governo quer, lá no fundo mesmo, é o monopólio da comunicação para moldar a opinião pública em torno de um projeto de poder. Foi isso o que esteve no cerne de todas as tentativas. Nenhuma deu certo graças à força da sociedade civil brasileira.

Agora, o governo resolveu comer o mingau pela beirada. Passou a bola, numa primeira etapa, aos estados governados majoritariamente pelo PT. É o caso do Ceará, que já elaborou lei fiscalizadora e que, com indisfarçável articulação, está sendo seguido por Alagoas, Piauí e Bahia. Pretende-se constituir conselhos para atuar no controle dos veículos de comunicação. O próximo passo é jogada cantada. O governo federal trataria de regulamentar a ação dos conselhos estaduais, sob pretexto de padronizá-los. Teríamos, por um atalho, instalada a censura no Brasil. Sei que tem gente séria e bem intencionada que, ingenuamente, acredita que os conselhos “fortalecem a democracia”. Os conselhos podem ter uma fachada democrática, mas seu presumível aparelhamento os transforma rapidamente em braço do governo.

Não defendo, por óbvio, uma imprensa irresponsável.

Sinto-me com autoridade moral para condenar o espírito dessas iniciativas.

Afinal, tenho martelado, teimosa e reiteradamente, que a responsabilidade é a outra face da liberdade. Não sou contra os legítimos instrumentos que coíbam os abusos da mídia.

Mas eles já existem e estão previstos na Constituição e na legislação vigente, sem necessidade de novas intervenções do Estado A sociedade brasileira rejeita a censura.

Segundo o professor de ética e política da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Roberto Romano, os eleitores mandaram um recado aos políticos por meio das urnas. “Não temos mais um rebanho”, afirmou o especialista. Os 40 milhões de votos dados ao candidato derrotado indicam algo.

Há uma fatia expressiva do eleitorado que não se deixa levar pelo discurso populista. E isso, sem prejuízo da legitimidade do voto vitorioso, é muito importante como contraponto às aventuras autoritárias. A democracia brasileira amadureceu. Cabe esperar que a presidente Dilma Rousseff tenha a sabedoria de captar o recado profundo das urnas.

Publicado no Jornal ATARDE-15/11/2010

 

Leave a Reply