Por: Samuel Celestino
Vem do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que se distanciou da política partidária, mas continua vinculado, como figura maior, ao PSDB, uma contundente declaração, oportuníssima, por sinal, além de reveladora. Disse ele que “Uma coisa é o governo, a coisa pública; outra coisa é a família. A confusão entre seu interesse de família ou seu interesse pessoal com o interesse público leva à corrupção que é o cupim da democracia.” Referia-se ao novo escândalo republicano envolvendo Rosemary Noronha, “amiga íntima de Lula,” segundo ela própria revelou, de quem conseguiu, com um descomunal poder político na era do ex-presidente, nomear dois irmãos para comandar duas agências, a ANA e a ANAC, Paulo e Rubens Vieira, ambos já demitidos por Dilma, seu ex-marido e sua filha para cargos importantes. Todos caíram. Luiz Inácio (é como Rosemary o chama) nada disse. Trancou a boca e foi para o mundo da lua, como o fez no início do mensalão.
FHC disse mais, bem pontuando, ao verificar que Lula se esquiva de falar qualquer coisa e de dar explicações sobre “as relações confusas que foram estabelecidas em seu governo.” Criticou “a confusão entre o público e o privado” na gestão petista. Completou: “Temos que descupinizar essa confusão que está havendo entre o interesse público e o interesse privado.” Vai ser difícil, porque o País, em termos de ética, de moral, está de ponta cabeça e abre espaço à desvairada gatunagem que se observa. Em qualquer outro País de tradições, haveria um transtorno nacional, especialmente se o que aqui ocorreu tivesse acontecido no Reino Unido. Na Itália, não, seria a mesma coisa.
Este País até parece que nasceu torto, cresceu torto quando colônia e desconheceu a República. E assim permanece até hoje. Sequer o Supremo havia julgado os três últimos mensaleiros, na última quinta feira, quando explodiu a Operação Porto Seguro, da Polícia Federal, este um novo escândalo palaciano. Porque seus tentáculos estavam dentro do Palácio do Planalto ou, se quiserem, na chefia de gabinete paulista da Presidência da República. Tanto faz. Ou fazia. Daí se espraiou para diversas instituições atingindo funcionários dos altos escalões, alguns vinculados ao poder maior da República, como é o caso de Rosemary Noronha, nomeada por Lula e ex-secretária de José Dirceu, durante 12 anos, tempo maior do que a pena a ele aplicada pelo STF. Belíssima escola política!
O escândalo impactou o País. A presidente Dilma Rousseff, de imediato, determinou a demissão todos os envolvidos e seus parentes acoitados em cargos maiores. Enquanto isso, embora as nomeações tenham acontecido na sua gestão, o ex-presidente, com se referiu FHC, não disse palavra. Poderia dizer que tudo é falso, que nada aconteceu, que é mentira, que é invenção da mídia, como o fez em relação ao Mensalão, embora antes tivesse pedido desculpas ao País pelo acontecido. O impacto do escândalo tocou nas altas esferas políticas e no próprio governo da presidente Dilma Rousseff e o abalou.
É natural que não se queira ou se exija que os reflexos do trabalho do Supremo tenham efeito imediato. No caso da Operação Porto Seguro, a corrupção vinha acontecendo sistematicamente há anos. Não se sabe, ainda, desde quando, mas partia de Rosemary Noronha, em São Paulo, que viajava ao exterior com passaporte diplomático no aerolula. Pertinho do chefe. Certamente ela se considerava invulnerável pelo seu relacionamento com o poder. A elucidação dos fatos ainda está em andamento. Poderá vir a atingir outros funcionários públicos.
A imagem do Brasil no exterior havia melhorado no quesito corrupção, mas voltou ao marco anterior, por também envolver organismo que deveriam estar imune, como a Advocacia Geral da União, AGU. As tramoias recaem sobre o segundo em importância da instituição, o advogado José Weber Holanda, que era o braço direito de Luís Inácio Adams. Cotado, inclusive, para ocupar uma das cadeiras do Supremo Tribunal Federal.
Para concluir o inferno de Dilma, a economia brasileira está indo para o brejo. Cresceu míseros 0,6% do PIB no último semestre. A estratégia de consumir para crescer valeu até endividar, levando o setor industrial com ela.
*Coluna de Samuel Celestino publicada no jornal A Tarde deste domingo (2)
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