Combate à Corrupção – Entrevista de Lizete Verillo

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A Amarribo (Amigos Associados de Ribeirão Bonito) surgiu em 1999 com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento humano da cidade através da fiscalização do uso de recursos públicos no município. Em 2002 formalizou denúncias contra os administradores da cidade que culminaram com a renúncia do prefeito de Ribeirão Bonito. Sua diretora de combate à corrupção, Lizete Verillo, fala sobre a importância da participação da sociedade civil e das formas de mobilizar a população, em uma tentativa de mudar a cultura de apatia que está enraizada na sociedade, destacando que “a grande arma para isso é a informação e sensibilização do cidadão“.

Ela também ressalta que ainda existem muitas dificuldades para que o combate à corrupção seja efetivo. “A educação não privilegia o aprendizado da ética, da cidadania”.

A Amarribo se define como uma organização que atua com a sociedade civil, a administração pública, lideranças políticas e a iniciativa privada, para acompanhar a gestão dos bens públicos e a preservação dos valores e do patrimônio cultural da cidade de Riberão Bonito. Como é o trabalho desenvolvido por vocês?

Lizete Verillo: Temos uma atuação tanto na área social dentro da cidade de Ribeirão Bonito quanto de cidadania e promoção da probidade e combate à corrupção em âmbito nacional. Depois de um passado em que a atuação da sociedade inibiu atos de corrupção na administração pública, nossa atuação hoje se volta para promover a participação do cidadão na vida política de sua cidade. Fazemos isso dando ferramentas de controle social e orientando a formação de organizações da sociedade civil com esse fim.

Na história da Amarribo, chama a atenção o fato de ela ter tido importante atuação no combate a um esquema de corrupção envolvendo o então prefeito do município. Como foi que uma associação criada com o objetivo de promover o desenvolvimento humano da cidade se viu, de repente, com um papel de protagonismo na investigação e punição de um esquema de corrupção envolvendo o ex-prefeito da cidade? Embora estivesse prevista sua atuação supervisionando a administração pública, esse papel desempenhado por vocês os surpreendeu?

LV: Sim, porque em nenhum momento imaginávamos o que estava para acontecer. Fomos tomando decisões a cada novo acontecimento e aprendendo cada vez que uma coisa nova aparecia, e foram enxurradas de coisas novas nesse período. Aí está a importância do aprendizado e da replicação dos conhecimentos, que foi o que fizemos ao escrever o livro e iniciar a formação da rede que hoje conta com 187 ONGs associadas e com mesmos objetivos.

Não faz parte da cultura da população brasileira acompanhar e fiscalizar o uso de recursos públicos. O que fazer para mudar esse quadro e qual a importância da participação popular nesse processo? Como disseminar em outros municípios a iniciativa da Amarribo?

LV: A grande arma para isso é a informação e a sensibilização do cidadão, um papel importante para ser feito por todo cidadão consciente, pela imprensa, pelas ONGs, pelos políticos e juristas, etc. Nossa forma de atuação na Amarribo, não é para crescermos a rede rapidamente, mas crescermos com maturidade de decisão na hora da atuação, assim a rede cresce cerca de 8% há uns 3 anos e isso mostra que aos poucos cada um vai encontrando o seu momento de maturidade para participar, se sente pronto.

Como a Amarribo conseguiu mobilizar a população de Ribeirão Bonito a tal ponto que, no dia em que foi votada a instauração do processo de cassação do então prefeito da cidade, cerca de 1,2 mil pessoas (ainda mais se considerarmos que a cidade tem 11 mil habitantes) compareceram à porta da Câmara Municipal?

LV: Através do rádio, carro de som, folhetos, discussões em todas as rodinhas possíveis, jornal, mídia regional e nacional, reunião com líderes de bairro e de igrejas, mas principalmente, munindo a população com informação.

A sociedade civil encontra que tipos de dificuldades para fiscalizar a administração pública? Essas dificuldades são maiores ou menores em cidades pequenas?

LV: As dificuldades são de ferramentas, as pessoas não conhecem, não sabem quais direitos têm, não sabem obter as informações, tem medo. O nepotismo e ameaças são fortes, principalmente nas cidades menores. Existe o empreguismo nas prefeituras que torna imóveis os servidores públicos que sabem das irregularidades.

Como é o diálogo da Amarribo com instituições públicas que têm por missão combater a corrupção, como o Ministério Público, o Tribunal de Contas, o Poder Judiciário, a Polícia, entre outros? Existem trabalhos seus em parceria com esses órgãos?

LV: Hoje a Amarribo conversa bem com todos esses órgãos, tivemos algumas dificuldades no passado, mas fomos vencendo todas com insistência, persistência, fatos, recorrendo de decisões que não concordávamos. A parceria clara e transparente com esses órgãos é fundamental, e se um deles não funcionar, deve-se levar a instâncias superiores.

Como a Amarribo vê a atuação dessas instituições públicas? O que, na realidade atual, dificulta o ataque à corrupção – seja para organizações como a Amarribo ou as instituições públicas?

LV: A Justiça é lenta, a impunidade impera. Hoje, esse é o principal entrave. Por outro lado, a educação não privilegia o aprendizado da ética, da cidadania, não valoriza dignamente o professor, seja com salários, seja com atualização pedagógica e de conteúdo.

Qual é a importância da história da Amarribo para a formação, em todo o Brasil, de outras instituições e grupos populares que trabalham pela transparência na administração pública? Vocês têm contato e trocam experiências com essas instituições? Há casos semelhantes aos da sua Associação, em que a sociedade civil também teve papel fundamental no combate à corrupção?

LV: A Amarribo inaugurou um movimento de participação. A maioria das ONGs de nossa rede, que se formaram inspiradas na Amarribo (cerca de 150), tinham a motivação interna. A Amarribo apenas as despertou e deu instrumentação, orientação, encorajou. Já existia um modelo e uma história parecida. Na rede temos casos como a Matra de Marília (SP), a Asajan de Januária (SP) e a Ama-Paulínia (SP), todas com muitos resultados.

Diante de tantas notícias de corrupção, é possível ter esperanças de punição, reparo e efetivo combate? O que a Amarribo poderia dizer para não deixar a sociedade civil desesperançosa, seja com o poder público ou com os agentes políticos?

LV: A esperança é o que mais temos nesse trabalho que desenvolvemos na Amarribo porque coletamos resultados diariamente na rede. Todos os dias, temos notícia de algum avanço em alguma ONG ou cidade da rede, e isso tem sido um gás muito positivo para todos os seus membros. Sabemos que os resultados não são rápidos, mas melhor que sejam mais consistentes do que rápidos. Só a Justiça é que precisa ser mais rápida, pois todos os segmentos estão trabalhando no sentido de construir uma democracia sólida e um país melhor.

 

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