Por: Paulo Moreira Leite
Um dos grandes desserviços prestados pelo golpe de 64 foi vincular o combate à corrupção à instalação de uma ditadura militar.
O argumento dos generais que articularam o golpe era passar a idéia de que os métodos autoritários eram uma forma não apenas aceitável mas a mais eficaz para combater as práticas condenáveis de nossos políticos. Pretendia-se, com isso, justificar a deposição de um presidente empossado com base na constituição e cassar o mandato de políticos eleitos pelo voto popular.
Cidadãos honestos foram agredidos e humilhados. Juscelino Kubistchek, um dos mais populares políticos brasileiros de qualquer época, foi tratado de modo vergonhoso num IPM que nada apontou contra ele.
A prova dessa falácia foram os sucessivos escândalos produzidos nas sombras do regime militar, que o país pode conhecer à luz do dia depois que a imprensa deixou de ser censurada e os repórteres puderam fazer seu trabalho como se deve.
A visão autoritária sobre o combate à corrupção, no entanto, permanece. Seu maior alimento é o fracasso no combate a corrupção — algo que está aí, à vista de todos –, o que gera indignação e revolta. Muitas pessoas esquecem que, na impunidade de medidas de força, os abusos são ainda mais perigosos, pois podem ser cometidos num ambiente de descontrole, mentira e medo.
O Brasil nunca teve presidentes bem sucedidos em conservar a corrupção numa escala residual. Há esqueletos horrendos em todos os armários. Isso deu origem aquele mundo que o filosofo José Arthur Gianotti, insuspeito de simpatias com o atual governo, definiu como “zona amoral da política”.
O grande financiador de campanhas do PSDB foi enterrado com uma espécie de herói da pátria. O organizador dos pagamentos que ficaram conhecidos como mensalão consegue ser reverenciado até hoje pelo PT — ainda que discretamente.
Não se encontra um candidato que não tenha um “tesoureiro”. Não se conhece uma lista de contribuições políticas sem caixa 2. Não há empreiteiros que não considerem-se no direito de pedir ao Estado uma retribuição pela ajuda prestada na eleição dos governantes.
A situação real é esta. A ilegalidade e os interesses ilegítimos estão entrelaços no sistema político.
Combater a corrupção é um processo necessário para defender a democracia. Os absusos por baixo do pano, a troca ilegítima de favores e a venda de privilégios ameaçam a transparencia do Estado e destroem a credibilidade das instituições. Com isso, alimenta-se a atração por saídas autoritárias.
Num Estado presidencial, o exemplo vem de cima, o que torna a postura de Dilma Rousseff contra aquilo que a presidente definie com “mal-feito” digna de aplauso e apoio do país inteiro.
Se a corrupção tem-se revelado uma praga moderna e incurável, como se vê mesmo naqueles países que o senso comum aponta como mais civilizados, a experiencia ensina que a postura dos governantes cumpre um papel decisivo. Pode ser rigorosa, o que ajuda a manter a doença sob controle. Ou pode ser tolerante, o que ajuda a ampliar o mal.
Fonte:G1
Leave a Reply