Confissão de amor à minha terra
Por: Benjamin Batista Filho (Euzinho), em 09.12. 2006
O título desta crônica veio à minha memória em Salvador e guardei-o, com cuidado, no cofre da alma para escrever este artigo quando estivesse em Euclides da Cunha, pois, assim, burilado no forno da idéia, sob o sol dos sertões, sairia e soaria mais autêntico e verdadeiro. Cá estou, finalmente na Rua da Igreja e dentro da casa em que nasci, privilégio de poucos – poder retornar ao terreiro onde brinquei quando criança e olhando o pé de Mangueira, plantado por nossa mãe Menininha, há 70 anos, mangueira/irmã, que deliciou aos 10 filhos do casal Benjamin Batista de Macedo e Ma Brazília de Macêdo a vida inteira, manga espada que só em falar me ponho de água na boca…
Começo contemplando o céu, como quem está no cio, idílio de um filho apaixonado pela terra em que nasceu. Restos de nuvens brancas da chuva que caiu ontem, desfilam no espaço, quiçá, nimbos oriundos da evaporação do Açude de Cocorrobó, tapeação que arranjaram para tentar esconder a desgraceira ocorrida em fins do século IXX em Canudos, quando o cearense Antônio Vicente Mendes Maciel – O Conselheiro – e seus seguidores, precisavam de sementes e enxadas para plantar e colher, eis que mandaram espadas e punhais para degolarem suas cabeças, canhões para destruírem suas casas de taipa e Igreja de tijolos e para silenciarem seus sinos e ladainhas.
Mas, Euclides, no seu livro vingador, Os Sertões, sentenciou: Canudos não se rendeu. O sertanejo é, antes de tudo, um forte.
Todavia, quero falar das coisas que vi e senti, recentemente, pois cheguei dia 07 de dezembro de 2006 para amanhecer descansado, ir à missa, beber com os olhos a beleza da Matriz, toda cercada, iluminada com o dinheiro dos fiéis e empenho pessoal do Padre Jaime. Depois das grades em torno do templo sagrado, os namorados mais afoitos tiveram que fazer seus coitos em outros bairros, becos ou motéis, pois, sinceramente, para tudo tem hora e lugar, porém nunca, repito, nunca, nos escurinhos e proximidades da igreja, pois ali o verbo deve ser outro, lugar de oração e do exercício da fé, como a que presenciei na última noite de Novena, as pessoas humildes das comunidades (distritos) entrando, com garbo, andor no ombro, devoção na alma, a roupinha simples, o chapeuzinho de palha ou de couro, o jaleco, o sapato “roló” nos homens, a sandaliazinha japonesa nas mulheres, mas as imagens de sua devoção, todas arrumadas, bem vestidas, cheias de flores, dirigindo-se ao altar, onde o bispo da Diocese de Serrinha e os auxiliares aguardavam esses heróis anônimos, arautos de sua fé simples e verdadeira.
No meio da igreja, medindo-se as proporções, observando tudo com lágrimas nos olhos, com pena do meu povo sertanejo e orgulhoso por fazer parte da mesma tribo (quase todos tapuias, massacarás, quiriris da Mirandela e Banzaê, ou tucanos do crenqüenhen ou tracupá ou ainda dos valentes enraizados no Caimbé e Tingüibuhén) senti a mesma luz que vi em Roma, na Itália, recentemente, quando na Basílica de São Pedro – a maior do mundo, recebia devotos e turistas de todos os cantos para recebermos a benção do Papa Bendictus PP XVI de cujo pontífice trouxe a foto autografada para os oito irmãos que tenho, pois o mais velho, Waltinho, deixou-nos há pouco tempo, mas fui visitar seu túmulo, dia 8, no cemitério, onde também estão meus avós Manoel Batista de Macêdo e Jozina, meus sempre amados pais Benjamin e Menininha e onde quero que meu corpo descanse um dia, chão da minha terra e falo essas coisas porque não se pode falar da vida sem lembrar da morte, e há muita gente boba por aí, metida a besta, achando-se dona do mundo, que não busca conhecer Deus, Pai Todo Poderoso, Criador de tudo e de Si mesmo, pois se alguém o tivesse criado seria maior do que Ele. Deus incriado, por isso eterno, até onde nossa mente não alcança… Douta ignorância: saber que não sabe…
Quero falar da fé dessa gente incrível, que, como fênix, a cada instante, renasce das cinzas. Foi belíssima a cerimônia de casamento de minha sobrinha Ma Gorete, filhei de Zezé e Mariazinha, com Luiz Cláudio. As famílias estiveram reunidas. Muitos eu não via há mais de 20 anos. Outros, eu tinha visto no aniversário de 50 anos de Maurinha, minha irmã, em noite memorável ocorrida no Hotel do Conselheiro. Sem dúvida, pelo carinho, pela hospitalidade, pelo clima, pela vibração, pela magia de reunir pessoas queridas de todos os segmentos familiares e sociais, o casamento de Goreti (“bença, dinha Mariazinha”) e o aniversário de Maura, somando-se ao carisma e carinho de Otílio, o velho Cumbe jamais viu festa tão bonita e significativa. Nossas famílias têm o condão de reunir, na mesma oportunidade, adversários políticos que lá fora disputam poder, compreensão e incompreensão, mas quando estamos juntos, festejando, face, sobretudo, aos alicerces de amizade construídos na infância ou através de nossos saudosos antepassados, convivemos, celebramos e até lamentamos, com sinceridade, o quanto poderíamos ser mais amigos e saborear melhor a convivência, pois às vezes o poder cega, maltrata e tudo é tão passageiro…
Os amigos, deputado Zé Nunes e o vereador Zé de Fulgêncio (Io Cavalheiro do Município, esposo da prefeita Rosângela, minha amiga e integrante da Academia de Letras e Artes de E. Da Cunha que agora recebe seu apoio), sabem do que estou falando. Aos dois pela amizade que nós 3 construímos na infância e por já haver servido a ambos e os 2 a mim, só eu posso dizer aos 2 coisas que ninguém ousaria a dizer, nem pode, pois amizade antiga e verdadeira (como a nossa) tempestade política não destrói, por isso os admiro e vou continuar acompanhando a trajetória desses 2 titãs idealistas, cada qual seguindo o seu caminho…
Agora, surge a FACE que agasalha os filhos e amigos de Município de Euclides da Cunha e já existe gente aí com medo, achando que é um movimento para tomar o poder. Não tenham medo, euclidenses, a FACE tem objetivos sagrados. No entanto, se o poder vier à FACE, será bem recebido. Somos filhos e amigos pensantes que desejamos o melhor para nossa terra. A embaixada euclidense em Salvador. Temos sede própria em Cumbe: na rua da Igreja bem ali, na casa onde viveu Dona Priquita e sua filha Tidinha. Nesta direção, deixo um abraço para a Diretoria da FACE: João Campos de Abreu (João da Tidinha), nosso diretor presidente, Antônio José Neiva Lemos, diretor administrativo, Josefa Bastos, diretora de assuntos sociais, Laércio Almeida Santos, Ma Auxiliadora de Abreu Macedo, diretora de meio ambiente, Rubens Ribeiro Bastos, diretor de desenvolvimento e turismo, Ronaldo Campos, diretor de educação e cultura, José Dionísio Nobreza, diretor de preservação histórica, Cláudio Lima, Diretor de Combate a corrupção e Valdélio de Araújo Magalhães, diretor de assuntos de segurança de trabalho.
Entretanto, quando, no sábado, dia 9 -, a chuva chegou no fim da tarde, foi humilhante para os feirantes, a enxurrada levando as mercadorias e a Av. Ruy Barbosa virando rio, uma vergonha para o povo e visitantes. Como é que não temos ali, saneamento básico? Por que não temos asfalto nem semáforos no centro da cidade?
Os carros e as motos entram na contramão parecendo as ruas do Iraque. Onde está o Ciretran para organizar o trânsito? Calçamento é bom e necessário, sobretudo nas ruas mais distantes das artérias principais. Olhem Serrinha, vejam Senhor do Bonfim, quase tudo asfaltado, cara de cidade civilizada.
Não é mais tempo da Rua do Jegue Morto, Rua do Agarra Mão (este, aliás um bonito nome, pois lembra namorados de mãos dadas, celebrando o amor) nem mesmo do Beco da Alice Grande, nem do Tanquinho da Bosta ou do Açude Velho, este onde eu aprendi a nadar, correndo do primo, soldado e amigo Raimundo Vaca Braba – que tomava nossas roupas, pois era proibido tomar banho ali e usávamos “pau de fufú”, como bóia e depois voltar para casa, correndo, para o catecismo, pegar a freqüência, no Domingo, assistir a matinée do Cine Maria das Graças, propriedade do saudoso Jonas Abreu e quando a fita quebrava, a gritaria:
“Quero meu dinheiro”
Ah! Meu Cumbe, querido Cumbe!…
Aqui estamos, agora fortalecidos, lidos e viajados, pensando bem com a cabeça e com a FACE rubra de emoção e vontade de resgatar seu passado e patrimônio histórico, defender seu meio ambiente e semear sementes de paz. Não queremos lhe ver nos jornais ou na televisão porque alguém assaltou o Banco do Brasil, deu tiros ou colocou bombas no corpo de gerentes inocentes e pais de família.
Seu merecimento é outro: começar fortalecendo sua fé, reformar sua Santa Cruz na serra cheia de esperanças e saudades, antenas revelando o progresso e a necessidade de ordem, ordem unida,
Cumbe, meu Cumbe…
Benjamin Batista, escritor e poeta, pertence a Academia de Cultura da Bahia.
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