Políticos que enfrentam graves acusações na Justiça deverão ficar impossibilitados de concorrer a cargos eletivos por um prazo de oito anos. Este é o mote de um projeto de iniciativa popular que será entregue ao presidente da Câmara de Deputados, Michel Temer (PMDB-SP), no próximo dia 29 pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), que em todo o país reuniu até agora mais de 1,1 milhão de assinaturas de eleitores, e precisa de pouco menos de 200 mil para completar as 1,3 milhão exigidas pela lei para uma proposta do tipo (1% dos eleitores brasileiros).
O projeto é polêmico e divide opiniões, mesmo entre advogados e juízes eleitorais. Catapultada pela Campanha Ficha Limpa, a proposta aumenta o rol de inelegibilidade da lei 9.840/99, ou Lei de Inelegibilidades, que, de acordo com o MCCE, já permitiu a cassação de mais de mil políticos por compra de votos e uso eleitoral da máquina administrativa.
Temerária – Especialista em Direito Eleitoral, o advogado baiano Vandilson Costa acha que a proposta é uma “temeridade”. Costa lembra que, em alguns estados, ainda existem grupos políticos locais com ascendência sobre o Poder Judiciário, os quais ingressam com ações visando prejudicar seus adversários políticos. “É muito arriscado”, acredita o advogado.
Já o professor de Direito Eleitoral da Universidade de Brasília (UNB), Walter Porto, lembra que há entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF): a inelegibilidade só deve alcançar aqueles com sentença condenatória transitada em julgado.
O juiz Marlon Reis, presidente da Associação Brasileira de Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais, defende o projeto. Reis lembra que o princípio da presunção de inocência vigora no direito penal, mas no direito eleitoral deve-se enfatizar o princípio da precaução, “que é muito diverso, e é um princípio de proteção à sociedade”, observa o magistrado. “Se há um sinal grave, é razoável que o aspirante a cargo eletivo seja cautelarmente afastado”, salienta.
Inelegíveis – Pela proposta, cujo nome oficial é “projeto de lei de iniciativa popular sobre a vida pregressa dos candidatos”, ficariam inelegíveis por oito anos todos os cidadãos que tiverem sido condenados em primeira ou única instância, ou tiverem denúncia acatada pelo colégio de ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) – para onde vão as ações contra autoridades públicas com foro privilegiado.
Nesses casos, valeria a inelegibilidade sendo grave a acusação: racismo, homicídio, estupro, tráfico de drogas, desvio de verba pública, entre outras recomendadas pelo projeto. “Da forma como é hoje, o foro privilegiado acaba funcionando como um escudo”, observa Cristiane Vasconcelos, secretária-executiva do MCCE.
O juiz eleitoral Marlon Reis descarta a possibilidade de a proposta dar asa às perseguições políticas. “Não é crível que um grupo de magistrados se reúna para perseguir alguém”, sentencia Marlon Reis. “Além do mais, vale lembrar que a regra valeria somente para os detentores de foro privilegiado”.
Levantamento – Um levantamento feito esse ano revelou que, juntos, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) acumulam 488 processos contra autoridades dos três poderes. Pelo projeto, também ficariam impossibilitados de se candidatar os portadores de mandato que, diante de uma investigação, optam por renunciar para escapar da cassação.
O recurso é utilizado largamente em todo o país. No Congresso Nacional, os casos mais famosos aconteceram em 2001 no Senado: renunciaram o falecido senador baiano Antonio Carlos Magalhães, e também José Roberto Arruda e Jader Barbalho. Todos recuperaram seus mandatos eletivos. Na Câmara de Deputados, a manobra foi usada por Pinheiro Landim (2003) e Severino Cavalcanti (2005). O senador Joaquim Roriz fez o mesmo em 2007. “Esses políticos, após recorrer ao artifício da renúncia, muitas vezes retornam com mais votos, porque têm grande influência política em seus estados”, ressalta Reis.
Fonte: ATARDE ON LINE
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