ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
Diferentemente de Marco Maciel e José Alencar, que foram extremamente leais respectivamente a Fernando Henrique Cardoso e a Lula, a expectativa é de que Michel Temer seja um vice em que a presidente Dilma Rousseff vá confiar, mas desconfiando.
Ele é presidente do maior partido do país, exerce inequívoca liderança no Congresso e tem personalidade política e pessoal mais forte do que seus antecessores.
Com seis mandatos consecutivos na Câmara desde 1987, Temer será um intermediador dos interesses do PMDB no novo governo. O preenchimento do primeiro escalão passa por ele.
Paulista, 70 anos, Temer entrou na política quase por acaso. Era professor de direito constitucional na PUC-SP quando passou a se reunir com peemedebistas como FHC, José Serra, Mário Covas e Paulo Renato Souza para eleger Franco Montoro governador de São Paulo em 82.
Seu primeiro cargo foi o de procurador-geral do Estado, mas Montoro perdeu dois secretários de Segurança e no final do primeiro ano de governo chamou Temer. Ele tentou reagir: não entendia nada de direito penal nem da área de segurança: “Nem sei onde fica a secretaria”.
Montoro não aceitou o “não” e o nomeou secretário, com a tarefa de harmonizar as polícias Militar e Civil.
Cinco dias depois, Temer estava “desesperado” e decidido a renunciar, quando viu pela TV uma entrevista do dramaturgo Gianfrancesco Guarnieri ensinando: “A vida é uma representação. Você tem de representar o papel que a vida te entrega”.
Ficou na secretaria (que reassumiria em 1992 para tentar controlar a crise decorrente do massacre do Carandiru), disputou a eleição de 1986 para o Congresso Constituinte e jamais deixou de representar os papeis que lhe couberam. O da Vice- Presidência é o principal deles.
Quando Montoro e seus companheiros criaram o PSDB em 1988, Temer ficou no PMDB: “O PSDB tinha muito cacique. Ouvi o conselho de Montoro: quem ficasse no PMDB iria fazer carreira”. Ele jamais trocou de partido, mas trocou de “turma”.
Como deputado e presidente da Câmara pela primeira vez (1997-2000), foi um dos articuladores do apoio peemedebista aos dois mandatos de FHC (1995-1999 e 1999-2003). Depois, liderou a aliança que deu ao PMDB a vaga de vice do tucano José Serra na eleição de 2002 (que ele perdeu para Lula).
Aos poucos, porém, foi trocando de parceria e se aproximando de Lula, do PT e finalmente de Dilma.
A missão do ministro José Dirceu (Casa Civil) para o PMDB apoiar o primeiro mandato de Lula em troca de dois ministérios fracassou.
Quem conseguiu o feito foi o ministro Tarso Genro, já na campanha da reeleição, em 2006, com Lula fragilizado pela crise do “mensalão”.
A primeira conversa Lula-Temer foi difícil, pois a versão corrente era de que um não gostava do outro. “Vamos furar esse tumor”, propôs Temer, dizendo que tudo era “intriga” e que “admirava a biografia de Lula”.
Saiu da conversa levando três ministérios para o PMDB –que chegaram a seis no final do governo e devem no mínimo se manter sob Dilma.
Mais difícil será negociar as cúpulas do Congresso. O PMDB tem hoje as presidências da Câmara e do Senado, mas o PT elegeu mais deputados. Disputam Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) e Cândido Vaccarezza (PT-SP).
O desempate será o primeiro teste de Temer. Ele, porém, tem como meta “acabar com o preconceito de que o PMDB só pensa em cargo”. E promete atuar sempre nos bastidores: “Serei discretíssimo. Não tenho a menor vocação para carro alegórico”.
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