Ministros de Lula (PT) que já ocuparam cargo de governador têm entrado em rota de colisão com seus sucessores e suas próprias bases, por conta de movimentações para manter influência regional. Na Bahia, a indicação da ex-primeira-dama Aline Peixoto a um cargo vitalício no Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) ampliou desavenças entre o ex-governador e ministro da Casa Civil, Rui Costa (PT), seu marido, e o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT), que o antecedeu no cargo. A articulação, patrocinada por Costa, também gerou embaraços ao atual governador Jerônimo Rodrigues (PT), eleito com seu apoio e o de Lula no ano passado. Em estados como Maranhão e Piauí, ações de ex-governadores vêm provocando impasses.
Aliados próximos de Lula e responsáveis pela sequência de 16 anos do PT à frente do governo da Bahia, Costa e Wagner divergiram publicamente por conta da candidatura de Aline ao TCM baiano. Na última semana, o senador relatou aos portais Metro e BNews ser contrário à indicação da ex-primeira-dama, enfermeira de formação, e disse preferir que a Assembleia Legislativa da Bahia escolhesse um parlamentar. A oposição ao PT apresentou a candidatura do ex-deputado Tom Araújo (União), numa articulação do ex-prefeito de Salvador ACM Neto.
As sabatinas ocorrerão no fim deste mês e, como a escolha ocorre por voto secreto na assembleia, há expectativa de eventuais traições na base petista, devido a insatisfações com o fato de Costa ter se envolvido diretamente na construção da candidatura da mulher. O ministro se reuniu com deputados estaduais do PT nas últimas semanas e, segundo aliados e adversários petistas, participou das tratativas para que os seis parlamentares do PP aderissem à base do governo Jerônimo, de olho em obter maioria confortável na assembleia para votações delicadas, como a do TCM.
A reaproximação com o PP ocorreu cerca de um ano após Wagner passar por um racha com o líder do partido no estado, o ex-vice-governador João Leão, que apoiava uma candidatura de Costa ao Senado para que pudesse assumir o Executivo. O plano, que desfavorecia o senador Otto Alencar (PSD-BA), enfrentou resistência de Wagner e foi derrubado, o que frustrou tanto Leão quanto Costa. Segundo integrantes da base e da oposição ao PT, o motivo da contrariedade com a indicação ao TCM ocorre por problemas pessoais com Aline, casada com Costa desde 2014, ano em que ele se elegeu ao governo com apoio de Wagner. Aliados do PT também criticam a articulação de Costa.
— Infelizmente, o que estamos percebendo é uma pressão do ex-governador, pessoalmente imbuído da tarefa de impor que uma familiar seja empossada como conselheira do TCM. A Bahia não pode ser um protetorado de Rui Costa – criticou o deputado estadual Hilton Coelho (PSOL) em sessão na semana passada.
Na tentativa de evitar que o atrito entre Costa e Wagner, ambos influentes na base petista, respingue na sua governabilidade, Jerônimo tem buscado garantir apoio à mulher do ministro entre os deputados, sem descuidar da relação com o senador, que emplacou apadrinhados em cargos de primeiro escalão da gestão estadual. Procurados via assessoria, Jerônimo e Costa não retornaram os pedidos de entrevista do GLOBO.
Acordo desfeito
No Maranhão, o ex-governador e senador eleito Flávio Dino (PSB), atual ministro da Justiça e Segurança Pública, vem acumulando atritos com seu correligionário e sucessor, Carlos Brandão (PSB), desde o início do ano. Brandão incomodou integrantes de sua base mais próximos a Dino ao ignorar os apelos para apoiar a recondução de Othelino Neto (PCdoB) à presidência da Assembleia Legislativa do Maranhão e, em seu lugar, emplacar a aliada Iracema Vale (PSB). O acordo pela reeleição havia sido costurado no início de 2022 com envolvimento direto de Dino, que também indicou a mulher de Othelino, Ana Paula Lobato (PSB), como sua primeira suplente no Senado, para garantir o apoio do clã a Brandão. Ana Paula vem exercendo o mandato de senadora.
Na semana passada, Iracema assumiu o governo temporariamente para assinar a posse do sobrinho do governador, Daniel Brandão, em cargo vitalício no Tribunal de Contas do Estado (TCE).
Aliados próximos a Dino afirmam que o novo governador tenta “dar sua própria cara” à gestão e que isso torna naturais algumas arestas com o antecessor, mas negam um rompimento. Outros dois focos de tensão iminente são a montagem do secretariado de Brandão, ainda não concluída, e a definição de candidaturas para as eleições municipais de 2024. Segundo interlocutores, Brandão ainda não assegurou abrigo para apadrinhados de Dino, como o próprio Othelino, cotado a uma pasta de representação em Brasília.
Já a corrida pela capital São Luís, hoje sob a gestão de Eduardo Braide (PSD), envolve dois possíveis candidatos do PSB: o deputado estadual Carlos Lula, secretário de Saúde na maior parte do governo Dino, e o deputado federal Duarte Jr., que aproximou-se de Brandão ao concorrer à prefeitura em 2020 pelo Republicanos, partido do vice-governador à época. Brandão também vem mantendo boa relação com Braide, que era opositor de Dino.
— Houve um estremecimento na relação dentro do grupo, que foi montado no governo Dino. Mas os partidos como PCdoB, PSB e PT estão na base e garantindo uma assembleia sem oposição. Em 2024, é natural que Brandão apoie alguém desse grupo, ou se mantenha neutro em caso de mais de uma candidatura — disse o deputado Carlos Lula.
No Piauí, aliados enxergam as digitais do ex-governador Wellington Dias, atual ministro do Desenvolvimento Social, na gestão do sucessor, Rafael Fonteles, também do PT. Segundo interlocutores, isso se dá por uma diferença de “estilos”, mas sem atrapalhar na relação, harmônica até aqui. Fonteles, que foi secretário de Fazenda em toda a gestão anterior, é tido como quadro “técnico” à frente do governo, enquanto Dias busca auxiliar o início de gestão com sua “capacidade política”. Influente no estado, o ministro busca apadrinhar escolhidos também em cargos federais, como na superintendência da Polícia Rodoviária Federal (PRF) no Piauí, como informou o blog da colunista do GLOBO Malu Gaspar. Neste caso, a preferência de Dias vem encontrando oposição entre sindicalistas, que atuam para reverter a indicação.
Há também sinais esporádicos de quebra de continuidade em alguns estados. Em Alagoas, uma possível substituição do secretário de Fazenda George Santoro pela gestão de Paulo Dantas (MDB), aventada por aliados do governo, pode encerrar a passagem mais longeva herdada de seu antecessor e aliado, Renan Filho (MDB). Santoro ficou oito anos no governo de Renan e, publicamente, nega ter decidido deixar o posto.
FONTE: O GLOBO
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