Nova geração do PT vê ‘sinal amarelo’ com eleição, pede espaço e quer foco no novo mundo do trabalho

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Por Guilherme Caetano-03/11/2024 | 09h00

BRASÍLIA – Na mesma semana em que uma reunião da cúpula do PT terminou com lavação de roupa suja entre tradicionais lideranças, uma das estrelas da nova geração do partido foi recebida discretamente no Palácio do Planalto. Enquanto um dos episódios é fruto do crítico desempenho eleitoral nas urnas no último mês, o segundo aponta para o espaço que a juventude petista luta para cavar.

Na segunda-feira, 28, dirigentes como Gleisi Hoffmann e Jilmar Tatto rebateram a portas fechadas uma declaração do ministro das Relações Institucionais do governo federal, Alexandre Padilha, para quem o PT havia amargado a “zona de rebaixamento” na disputa pelas prefeituras. O encontro foi marcado por duras cobranças a respeito da necessidade de um “reposicionamento” do partido após derrotas sofridas nas eleições municipais.

Três dias depois, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu uma das estrelas da nova geração do partido, Pedro Rousseff, sobrinho-neto da ex-presidente Dilma Rousseff. Aos 24 anos, ele foi eleito o sexto vereador mais votado (17,6 mil) em Belo Horizonte – cidade que viu surgir dois prodígios do bolsonarismo, Nikolas Ferreira e Bruno Engler –, e se encontra agora num seleto grupo de jovens petistas saídos vitoriosos das urnas.

As novas lideranças do PT veem o pleito como um “sinal amarelo” para 2026, querem mais espaço para acelerar a renovação tímida pela qual a sigla tem passado nas últimas décadas – o partido elegeu seis vereadores com até 30 anos nas capitais brasileiras, menos que os bolsonaristas. E também defendem uma conexão direta com as novas formas de trabalho, precisamente as informais, como motoristas de aplicativo e os empreendedores individuais, os MEIs.

Apesar do objetivo em comum, as novas lideranças têm conclusões diferentes sobre o tratamento que deve ser dado às demandas voltadas às identidades, especialmente de gênero, raça e sexualidade (chamadas de pautas “woke”, no inglês). Pedro diz se tratar de uma pauta importada dos Estados Unidos, e que a esquerda brasileira deveria se dedicar mais aos “empreendedores individuais”.

“Estamos preocupados agora é com 2026. Nosso discurso não tem que mudar à direita, mas ser direcionado às demandas que a população precisa. Falar sobre pautas identitárias, o movimento woke, isso tem que ser remodelado. O PT tem que voltar ao que era antes: falar sobre emprego, renda, transporte, meio ambiente, empreendedorismo social”, diz ele.

O tema tem se tornado uma casca de banana para a esquerda, e usado de munição pela extrema direita. Na campanha à Prefeitura de São Paulo, bolsonaristas miraram a esquerda com deboches e ataques após o hino nacional em linguagem neutra ser tocado durante um comício de Guilherme Boulos (PSOL). O então candidato Pablo Marçal (PRTB) apelidou-o de “Boules”. Já Lucas Pavanatto (PL) elegeu-se o vereador mais votado do Brasil com 26 anos e 161,4 mil votos após uma campanha anti-trans na capital paulista.

Luna Zarattini, vereadora de 30 anos mais votada (101 mil) do PT em São Paulo, e para quem a eleição municipal traz vitórias ao mesmo tempo em que acende um alerta ao seu partido, diz que a esquerda precisa de um projeto para o futuro, o que hoje não consegue apresentar ao eleitorado. Para ela, é possível popularizar o feminismo, a luta antirracista e a pauta LGBT sem abandonar o discurso da renda e do emprego.

A vereadora afirma que o Bolsa Família, por exemplo, lida com a questão de gênero ao obrigar o repasse do auxílio à mulher chefe de família. Isso permite, diz ela, uma autonomia feminina e consequente saída para ciclos de violência. “A gente está falando de minorias políticas que são maiorias (negros e mulheres). Se não estamos ganhando as pessoas que sofrem essas opressões, significa que a gente tem algum tipo de erro de linguagem ou de colocação. Não são temas contraditórios”, declara Luna.

Brisa Bracchi, 26 anos, sétima mais votada para a Câmara Municipal de Natal com 6,8 mil votos, segue a linha da correligionária ao afirmar ser preciso “mostrar como essas pautas não são antagonistas, mas complementares”. Ela diz ter sentido que a demanda dos trabalhadores autônomos marcou presença inédita nas campanhas municipais da esquerda este ano, apesar de já ter dado sinais em 2022.

“Foi percebido por ambos os lados do espectro político que esse novo perfil (de informais) compõe a classe trabalhadora e precisa de uma ação de política pública muito forte, porque tem na sua essência uma relação (trabalhista) frágil com as transnacionais e a ausência de uma política estatal”, diz ela.

Na capital paulista, o apelo de Marçal aos autônomos foi tamanho que, ao ficar fora do segundo turno da eleição, motivou um movimento estratégico de Boulos para atrair o eleitorado órfão do ex-coach. A “carta ao povo de São Paulo” – similar à carta aos evangélicos divulgada por Lula em 2022 – foi lançada pela campanha PSOL-PT na reta final da disputa como uma forma de assumir a falta de diálogo da esquerda com os trabalhadores informais.

Para Maíra Cunha, conhecida do Maíra do MST, eleita vereadora no Rio de Janeiro aos 29 anos (13,7 mil votos), as eleições municipais “escancaram a necessidade do PT de apostar na juventude e na renovação”. Mulher, preta, bissexual e vinda de movimento social, ela é símbolo da renovação numa cidade que seu partido nunca conseguiu governar.

“A direita conseguiu avançar muito com isso, de crescer em cima de um espólio da renovação da antipolítica. E o PT precisa olhar para essa tendência. Mas essa renovação precisa ser combinada com a experiência. Tem que ter muito cuidado de não cair no etarismo”, diz ela.

A demanda de Maíra encontra lastro em seu partido. Nas dez maiores capitais, 5,7% dos 35 vereadores eleitos pelo PT no mês passado têm menos de 30 anos. No Partido Liberal (PL) de Jair Bolsonaro, sigla arquirrival, a proporção é de 10,6% entre os 47 vereadores eleitos no mesmo número de cidades.

FONTE: O JORNAL ESTADO DE SÃO PAULO

 

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