Por Levi Vasconcelos_Bahia 247
Em início de ano eleitoral, como 2012, o assunto é recorrente. Sempre que grupos almejam se unir, mas se embaraçam na falta de critérios para escolher o cabeça de chapa, ou há um líder bem avaliado, mas sem nomes notoriamente expressivos para ele indicar como candidato, evoca-se o expediente: ‘Faremos uma pesquisa e quem estiver melhor, vai’.
Eis a questão: e pesquisa é referencial para a escolha de candidatos?
A literatura política é recheada de exemplos de gente que começou lá atrás, nas pesquisas, e chegou na frente, nas urnas. Sem falar que a definição de candidaturas passa pelo crivo da confiança do partido ou grupo político, o que necessariamente não é o mesmo sentimento da opinião pública, mais suscetível a inclinações preferenciais por motivos alheios às vontades partidárias.
O governador Jaques Wagner é um exemplo. Em 2006, foi candidato num cenário em que as oposições ao carlismo pareciam viver uma orfandade plena. Não havia quem ousasse lançar-se. Estava em Brasília, ministro das Relações Institucionais de Lula e lá ficaria se ligasse para pesquisas. Botou a cara e nem o próprio Lula apostava nele, a ponto de aconselhá-lo.
– Galego, aquilo lá é pedreira. É melhor você ficar cá.
Teimou, caiu em campo e ganhou. O primeiro a dar um pipoco público sobre o uso de pesquisas na escolha de candidatos foi Leonel Brizola, nos anos 80, no Rio. Voltando do exílio e sem aliados dos que estavam engajados no jogo político, agrupou o que podia, gente como o cacique Mário Juruna e o cantor Agnaldo Timóteo para coletar simpatias quando foi cantado pelo PMDB com o argumento supra:
– Instituto de Pesquisa não é partido político. Quem escolhe candidato é partido. Transferir tal prerrogativa para institutos de pesquisa é privatizar atos de consciência.
Brizola também saiu atrás e chegou na frente. Morreu em 2004, quando as pesquisas eleitorais já eram instrumentos básicos para a formatação das campanhas modernas, mas ainda era considerado um jurássico, um protótipo típico dos tempo em que frases de efeito e oratória inflamada temperadas com gestos espetaculosos eram o tcham para seduzir o eleitorado. Mas nem por isso estava errado.
Mas também nem por isso há quem viaje na contramão. Se você clicar no Google a expressão “pesquisa para definir candidato” (aspeada), vai ver que nos quatro cantos do Brasil muitos são os que recorrem ao expediente. Na hora da escolha ninguém exibe tais pesquisas, é verdade. Mas que dizem, dizem.
Não há pretensão, com isso, de negar a importância das pesquisas na política. É natural que os partidos façam pesquisas regulares, como fazem, para aferir a quantas andam os humores populares. Mas falar em pesquisa como paradigma para a definição de nomes, se não for discurso para acalmar os ânimos de alguns pretendentes que são mais candidatos a sobrar do que a prevalecer, é implícita confissão de incompetência política. Fico com Brizola.
ERUNDINA E O ERRO MAIS RETUMBANTE
Ademais, institutos de pesquisas erram, e não é de hoje. Por má fé do pesquisador que vai a campo, por falhas na definição da abrangência territorial ou mesmo do método utilizado, sem querer negar a importância das amostragens de intenções de voto nos dias de hoje, havemos de convir que os resultados não refletem a realidade e sim uma tendência. E ainda que bem feita, é o retrato de um momento. É, como diz Brizola, abdicar da consciência para entregar o poder de decisão a empresas.
É famoso no Brasil o grotesco erro ocorrido em São Paulo, em 1988. Rigorosamente todas as pesquisas davam a vitória de Paulo Maluf sobre Luiza Erundina na disputa da Prefeitura de São Paulo. Em 8 de novembro, a uma semana da eleição (aconteceria dia 15), a Folha de São Paulo publicou Maluf com 28%, João Leiva com 19% e Erundina com 14%. O Estado de São Paulo chegou a dar manchete dizendo que Maluf já preparava o seu secretariado.
Em 14 de novembro, véspera da eleição, a Folha divulgou nova rodada: Maluf 28%, Erundina 20% e Leiva 16%. Urnas abertas, Erundina tinha 29,*% dos votos, Maluf 24,4 e Leiva 14,1.
Outro episódio notável é o de Jaques Wagner, na Bahia, em 2006. Todas as pesquisas feitas ao longo da campanha apontavam a folgada vitória de Paulo Souto. Só no dia da eleição, para a surpresa geral, a boca de urna do Ibope, feita pela Globo, falou pela primeira vez, na vitória de Wagner, e no primeiro turno.
O que houve? No caso Wagner, o estatístico José Carlos Martins, diretor da Potencial Pesquisas, diz ter estudado a maioria das pesquisas divulgadas e notou que elas se limitavam a pesquisar apenas 30 municípios. Não deram a abrangência necessária e aí falharam.
A VITÓRIA DE WAGNER, OS PORQUÊS
Wagner ganhou em 2006 porque contou com três fatores determinantes: a popularidade de Lula, apesar da crise do mensalão (um ano antes), o desgaste do carlismo, no poder havia 16 anos, e também a capacidade de ter construído um leque de alianças que uniu todas as forças de oposição.
Habitual leitor de pesquisas, o radialista Cristovão Rodrigues, ainda durante a campanha, disse para Wagner:
– Acho que você tem chances. As pesquisas mostram Paulo Souto estagnado e você só crescendo. Devagar e sempre, mas só crescendo.
Wagner respondeu:
– Parece que só nós dois acreditamos nisso.
Wagner sempre acreditou que ganharia e dizia isso aos jornalistas abertamente. Todos entendiam como fato natural, o candidato sempre diz que vai ganhar por dever de ofício. Mas ele desenvolvia um raciocínio lógico. Em 2002, também disputando o governo, tinha o apoio de 17 prefeitos e um arco de alianças pequeno, apenas os tradicionais PCdoB e PV. Na urna, acabou com 39%.
Em 2006, era diferente. Tinha 70 prefeitos e o conjunto das oposições unido em torno dele. Era a lógica política pura e simples, nada de pesquisas. Estava certo.
Convém lembrar que, com todos os pecados ou possíveis percalços, as pesquisas hoje são fundamentais para estabelecer as diretrizes do marketing, algo vital nestes tempos de uso intensivo dos meios de comunicação de massa, além de balizar os apelos publicitários que pretendem fazer a sedução do eleitorado.
É a chamada sociedade midiática. A pesquisa funciona como o exame laboratorial para o médico: dá um painel da situação para estabelecer os caminhos do tratamento a seguir.
Cristovão com suas leituras de pesquisas também estava certo, mas aí há que se notar um detalhe interessante: as observações que ele fazia se baseavam numa série de pesquisas sequenciadas, que mostravam uma tendência. Muito diferente de uma pesquisa isolada, ainda que tecnicamente correta, muito pouco para sugerir uma decisão.
No frigir dos ovos, a compreensão deve ser única: partidos, pesquisas, campanhas e eleições fazem parte do mesmo pacote, um ancorando outro, mas pesquisa é pesquisa, partido é partido e urna é urna.
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