O presidente Lula ainda não passou a faixa e já projeta sombra espessa sobre o governo de sua sucessora Dilma Rousseff, que ele tirou do anonimato para o proscênio. Éum espectro vivo e obstinado, a vigiar nas ameias, a espreitar as antecâmaras. Antes de sair, ressente-se da perda do poder e prenuncia sua possível candidatura em 2014.
Tem sido um prodígio de amor próprio exposto. Vê-se projetado em mil espelhos, em vidraças, em nuvens róseas, em poças d’água. A poucos dias do final de um segundo mandato, gira sobre si mesmo, em órbitas cada vez mais concêntricas. Caso singular de narcisismo. O alto índice de aprovação pública o faz julgar-se libertador, justiceiro, pai dos pobres e da pátria; portanto, governante obrigatório.
Merece férias longas, com os churrascos e líquidos de sua dieta preferida, pelo muito que fez, largou a caminho ou apenas cogitou, e que registrado deixa em cartório para lembrete da história. Não sabe sair de cena com a discrição e serenidade dos que cumpriram o termo e as tarefas. Invade a autonomia da presidente eleita, ao preservar no ministério, em postos de grande peso político e econômico, auxiliares de sua confiança total.
Também desrespeita a pupila que impôs e elegeu, ao declarar-se desde já um dos presidenciáveis de 2014 – o que pressupõe a sua certeza de que o novo governo, pelo qual quebrou lanças, não será satisfatório, o que ensejaria o seu retorno nos braços do povo.
É mesmo de pasmar,mas o presidente Lula comporta-se nesta transição como um ator de menor categoria que domina o elenco.
Estar no poder,manejar o poder constitui, pelo visto, o fanal da sua vida política. Não admira que tenha admitido um terceiro mandato quando os áulicos soltaram balões de ensaio logo recolhidos à falta de vento. Prestes a encerrar oito anos de governo, Lula continua em campanha, a catapultar R$ 20 milhões para a festa de despedida, ou até breve. Resta ver como a presidente reagirá ao assédio continuado.
Editorial ATARDE- Edição de 22/12/2010
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