Carlos Geilson*
“Sou professor a favor da esperança que me anima apesar de tudo. Sou professor contra o desengano que me consome e imobiliza. Sou professor a favor da boniteza de minha própria prática, boniteza que dela some se não cuido do saber que devo ensinar, se não brigo por este saber, se não luto pelas condições materiais necessárias sem as quais meu corpo descuidado, corre o risco de se amofinar e já não ser testemunho que deve ser de lutador pertinaz, que cansa, mas não desiste”, Paulo Freire.
Foi-se o tempo em que diversão de criança era brincar de professor e aluno, por isso desafio a qualquer um perguntar aos filhos pequenos ou jovens o que eles desejam ser quando crescer. É certo que dirão: quero ser médico, advogado, engenheiro, jogador de futebol, ator, menos professor. Por detrás dessas respostas há a revelação daquilo que estamos habituados a sentir na carne: o desdém para com o nosso mister; provocado sobretudo pelo desgaste que a profissão tem sofrido, em decorrências das transformações educacionais, bem como em virtude da exposição da profissão como desvalorizada socialmente, mal remunerada e de rotina desgastante.
Entretanto, ainda que a escolha pela docência seja desejo de poucos, nenhuma outra profissão carrega consigo a nobre arte do ensinar. Por ser arte e por caminhar lado a lado com aquele que para o aluno é exemplo de sabedoria, ensinar é ato de responsabilidade, por isso deveria ser proibida atuação daquele que se envolva nele por falta de algo melhor para fazer, ou porque precisa de um bico para complementar a renda.
Médico ou advogado, engenheiro ou ator, não há qualquer especialidade que exista sem ter passado por lições e professores. Toda profissão, por mais técnica que seja, precisa de mestres.
Os salários dos professores do Estado da Bahia não são dignos, as instalações de trabalho (sala de aula, banheiros, estrutura física de modo geral), em alguns caso, precárias, mas a maior virtude do mestre está em acreditar que é possível transformar a educação em instrumento do desvendar e não com ela vendar as consciências. Está convencido, como assevera Fernando Pessoa de que “Para ser grande, sê inteiro: nada teu exagera ou exclui. Sê todo em cada coisa. Põe quanto és no mínimo que fazes. Assim em cada lago a lua toda brilha, porque alta vive”. Além disso, acredita nas palavras de Rubem Alves “não haverá borboletas se a vida não passar por longas e silenciosas metamorfoses”, apesar de saberem que as condições de ensino estão cada vez mais difíceis e, não raro, piores.
O que me chama atenção desde que começou a greve, foi a forma radical com que o Governo do Estado, que se diz republicano, forjado nas lutas populares, tratou essa questão dos professores. O governo alega não ter dinheiro para dar o aumento, entretanto nós da oposição encontramos que nos gastos com regime especial de direito administrativo (Reda), no ano pré-eleitoral de 2009 o governo gastou R$ 406 milhões com esse tipo de contratação e, no ano seguinte, R$ 420 milhões.
Em seu primeiro governo, Wagner totalizou um gasto de R$ 1,456 bilhão só com Reda. Eu não sou contra o Reda ou os prestadores de serviços temporários, mas defendo que não se use de uma forma indiscriminada, para aparelhar a máquina pública e servir de moeda de troca com a base governista. Então, visto isso, sabemos que dinheiro existe, mas o problema é a forma como ele vem sendo utilizado. Todos sabem que votei a favor dos professores e contra o projeto proposto pelo governo que reajusta o salário dos professores da rede estadual, aprovado na noite do dia 24 de abril.
O governador Jaques Wagner precisa entender que não está lidando com qualquer profissão. O professor que acampa na Assembleia Legislativa e está paralisado há mais de 30 dias, pertence, dentre todas as outras profissões, à mais importante para o país. Por ser maltratado diariamente, chegou a esse extremo porque precisa expor o seu dilema. “Me movo como educador, porque, primeiro, me movo como gente”, dizia Freire. Paralisar foi a forma que os professores encontraram de captar os olhares da sociedade, dos deputados e de Vossa Excelência, governador, para a necessidade de negociação, cuja pauta é acordar algo que é justo e fora prometido no ano passado: melhorias das condições de trabalho e de vida, que começam pelo reajuste de 22,22% ao salário.
No dia 1º de maio, homenageava em meu programa de rádio, pela passagem do seu dia, o homem e a mulher que trabalham. Dizia que trabalhar nos faz úteis à sociedade e que orgulhar-se do labor nos garante vida e não nos dá apenas a possibilidade de construir coisas materiais (casa, carro…), mas de construir, antes, autonomia, autoestima, moral e caráter. Precisamos recuperar a dignidade dos guardiões do saber numa sociedade de memória fraca e curta que desvaloriza coisas que não se acabam: a cultura, o saber e a educação!
* Carlos Geilson é deputado estadual (PTN).
bahiatodahora.com.br
Leave a Reply